Há algum tempo atrás, li esse belo poema de um amigo. Pedro me autorizou publicá-lo aqui.
Emocionei ouvindo
e ouvi perguntar se afastamos.
Não sei quando se começou,
mas sei que tento, e já há algum tempo,
não sentir o sentir por você.
É fato isolado mas que prende a uma dor
- não a do sentimento - a do devaneio.
É referência de coisas de muito valor:
alegria, força de vida, carinho solidário, pique e cumplicidade.
Um pouco de liberdade e tanto de vadiagem.
Uma indagação ansiosa sobre o que há de se aprender e uma velocidade para construir
pontes de amizade.
Uma irresponsabilidade junto a uma seriedade do olhar a vida.
Tudo muito bem empacotado.
Não me existia até lhe conhecer
e aí, eu passei a existir menos.
Mesmo sem que perdesse nada do que tinha quando inteiro.
Não dói, eu sim. Não por sua causa,
mas pelo que não há em mim.
Pior é nunca ter tido qualquer ilusão e,
o que para mim sempre foi fácil -
superar sentimentos, correspondidos ou não;
entregar-me a qualquer prazer, disponível ou não;
passar pelas pessoas sem deixar pedaços meus na estrada;
entrar e sair leve dos tempos e espaços - passou
e passou, no que vejo de mim para você, a ser tédio ou martírio -
e isso sem os dramas que normalmente agrego para valorizar minha razão -
E nem é você e não sou eu, mas o que imaginei - cópias melhoradas de mim para você
- motivaram-me bastante a buscá-las.
Um dia você comentou sobre gostar de mais de uma pessoa
e eu, que não enxergo nos entes propriedades,
tentei ser uma pessoa,ao menos dentro de mim,
mas não consegui.
Continuo deslocado do que entendo por gente,
preso no tempo, no desejo, no medo, no palácio, no munturo, na negação
- e nada disso tem relação com você.
Tenho num baú um monte de sentimentos que são seus.
Não serão resgatados,
não serão despejados,
não serão sentidos.
Um dia, quando o maleiro confundir minha bagagem sua com a de outra pessoa, eles
não terão serventia.
Se desfizerem a confusão, ainda assim, não servirão.
Ficarão lá, sem uso, porque sempre os soube alienados, sem chão onde germinar,
sem eu no rebote.
Ah, não estranhe o exagero, é próprio dos monólogos.
Da parte amiga e do baú, será impossível extirpar a saudade.
Das dores, serão postas em oratório e não causarão mais danos.
Serão adornos.
Confeites de um bolo cenográfico, não afeito ao paladar.
Nada disso me tira a alegria de encontrar você nem a presença possível de nós dois.
Subtrai somente o desejo imperativo de concretizá-la.
Esta, em termos de afeto, empatou com sua ausência
e não compartilho meu constrangimento.
Aliás só o consigo expor assim.
Numa poesia truncada que não precisou de você pra ser escrita.
Escrito por Pedro Domingues
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