sábado, 1 de outubro de 2011

Para Virgílio


Meu amor por você é como o céu. Do tamanho mesmo. Olho. Ele está ali, diante de mim, impalpável e visível. Para alguns tal como pano de fundo, para mim impregnando um voo, uma folhagem, o percurso de uma bola, a passagem de uma nuvem. Esse é o sentido de estar bêbado de amor.

Olho seu rosto que soa paisagens. Agora sério, agora embevecido, daqui a instantes aguerrido, há pouco peralta. E sinto que te escrevi sem te conhecer e que te conhecer é embrenhar-me no desconhecido, lugar sem atalhos, de sentidos flutuantes: quando acho que és tu, sou eu, e quando tenho certeza de me ver, enganei-me mais uma vez.

Olho seu rosto. Miro seus dentes, luar que se descortina quando você sorri. Com eles você rasgou meu peito e abocanhou, ainda pulsando, meu coração. Que luz é essa que deles emana, violenta e cálida, arrebatadora?
Deixo-me em imagens e você me colhe. Às vezes piegas, às vezes sonhador, às vezes penetrante.

Seguimos emaranhados, desejantes.

Olho seu rosto. Já há rugas em seus olhos, fios brancos em seus cabelos. Navego, então, nas marcas do seu tempo e descubro que amar é travessia: esgueirar-me para as terras de quem amo e furtivamente trazê-lo para minha quinta e num momento flagrar-me deitado ao sol sobre uma pedra num ribeirão em meio ao seu sítio.

E assim derivamos entre sítios e quintas, entre sonhos e lembranças, presente dádiva.

São suas as minhas palavras. E nos pertencemos. Como o gesto pertence à mão, como o azul pertence ao céu.

Caio Marques