sexta-feira, 16 de abril de 2010

O plantio da palavra

Querida Maria Claudia.

Quanto mais escrevo, mais me fascino pelo próprio processo da escrita. De onde vêm essas ideias? Parece, às vezes, uma loucura que me acomete. A pulsação do sentido. Lateja. Lateja. Lateja. A pulsação do sentido. O que o registro escrito diz do processo da escrita? O sentido pulsa em mim. O ofício do escritor é escrever. Por isso escrevo o máximo que posso: bilhetes, mensagens, cartas, poemas, contos, ideias, artigos científicos, observações à margem dos trabalhos dos meus alunos, comentários à margem dos livros, listas de compras, recados, notas, riscos. Algum pesquisador um dia investigará há quanto tempo escrevo “Call me Ishmael”.

Cultivo as palavras e as expressões. Corre seiva nas palavras. Nas veias do sentido, corre o quê? Cultivo supressões, repetições, podas. E no lugar de um galho cortado da laranjeira pende um ramo farto de ora pro nobis. Planto hoje aqui e a palavra não sossega, insiste em buscar outro jardim. Planto, então, na horta e os cães urinam sobre ela, escavam-lhe as raízes. Desassossego. Planto a palavra no pomar e ela teima em querer outro lugar. Um dia planto-a em companhia apropriada e ela se enraíza nesse convívio. Mas atenção: a cada vez que planto a palavra, ela se fortalece, mesmo se o convívio não é o apropriado. E quando ela se enraíza, deixa rescender os perfumes que acolheu em cada plantio.

Beijo,

Alberto

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